Processo REsp 841786 / RS ; RECURSO ESPECIAL 2006/0087815-1  
Relator(a) Ministro JOSÉ DELGADO (1105) 
Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA  TURMA 
Data do Julgamento 29/06/2006 
Data da Publicação/Fonte DJ  17.08.2006 p. 331
Ementa 
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO  ESPECIAL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU FALTA DE MOTIVAÇÃO NO ACÓRDÃO A  QUO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DE TARIFA DE ENERGIA ELÉTRICA.  INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO. CORTE. IMPOSSIBILIDADE. ARTS. 22 E 42 DA LEI Nº  8.078/90 (CÓDIGO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR). ENTENDIMENTO DO RELATOR.  ACOMPANHAMENTO DA POSIÇÃO DA 1ª SEÇÃO DO STJ. PRECEDENTES. 
1. Recurso  especial contra acórdão que considerou ilegal o corte no fornecimento de energia  elétrica como meio de coação ao pagamento de contas atrasadas ou para apurar  eventual irregularidade. 
2. Decisão a quo clara e nítida, sem omissões,  obscuridades, contradições ou ausência de motivação. O não-acatamento das teses  do recurso não implica cerceamento de defesa. Ao juiz cabe apreciar a questão de  acordo com o que entender atinente à lide. Não está obrigado a julgá-la conforme  o pleiteado pelas partes, mas sim com 
seu livre convencimento (CPC, art.  131), usando fatos, provas, jurisprudência, aspectos atinentes ao tema e  legislação que entender aplicáveis ao caso. Não obstante a oposição de embargos  declaratórios, não são eles mero expediente para forçar o ingresso na instância  especial, se não há vício para suprir. Não há ofensa aos arts. 165, 458, II, e  535, II, do CPC quando a matéria é devidamente abordada no aresto a quo. 
3.  Não resulta em se reconhecer como legítimo o ato administrativo praticado pela  empresa concessionária fornecedora de energia e consistente na interrupção de  seus serviços, em face de ausência de 
pagamento de fatura vencida. A energia  é, na atualidade, um bem essencial à população, constituindo-se serviço público  
indispensável, subordinado ao princípio da continuidade de sua prestação,  pelo que se torna impossível a sua interrupção. 
4. O art. 22 do Código de  Proteção e Defesa do Consumidor assevera que “os órgãos públicos, por si ou suas  empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de  empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros  e, quanto aos essenciais, contínuos”. O seu parágrafo único expõe que, “nos  casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste  artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos  causados na forma prevista neste código”. Já o art. 42 do mesmo diploma legal  não permite, na cobrança de débitos, que o devedor seja exposto ao ridículo, nem  que 
seja submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Tais  dispositivos aplicam-se às empresas concessionárias de serviço público. 
5.  Não há de se prestigiar atuação da Justiça privada no Brasil, especialmente,  quando exercida por credor econômica e 
financeiramente mais forte, em largas  proporções, do que o devedor. Afrontaria, se fosse admitido, os princípios  constitucionais da inocência presumida e da ampla defesa. O direito de o cidadão  se utilizar dos serviços públicos essenciais para a sua vida em sociedade deve  ser interpretado com vistas a beneficiar a quem deles se utiliza. 
6.  Caracterização do periculum in mora e do fumus boni iuris para sustentar  deferimento de liminar a fim de impedir suspensão de fornecimento de energia  elétrica. Esse o entendimento deste Relator. 
7. No entanto, embora tenha o  posicionamento acima assinalado, rendo-me, ressalvando meu ponto de vista, à  posição assumida pela ampla maioria da 1ª Seção deste Sodalício, pelo seu  caráter uniformizador no trato das questões jurídicas no país, que vem decidindo  que “é lícito à concessionária interromper o fornecimento de energia elétrica,  se, após aviso prévio, o consumidor de energia elétrica permanecer inadimplente  no pagamento da respectiva conta            (L. 8.987/95, Art. 6º, § 3º, II)  ”(REsp nº 363943/MG, 1ª Seção, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de  01/03/2004). No mesmo sentido: EREsp nº 337965/MG, 1ª Seção, Rel. Min. Luiz Fux,  DJ de 08/11/2004; REsp nº 123444/SP, 2ª T., Rel. Min João Otávio de Noronha, DJ  de 14/02/2005; REsp nº 600937/RS, 1ª T., Rel. p/ Acórdão, Min. Francisco Falcão,  DJ de 08/11/2004; REsp nº 623322/PR, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJ de  30/09/2004. 
8. Com a ressalva de meu ponto de vista, homenageio, em nome da  segurança jurídica, o novo posicionamento do STJ. 
9. Recurso especial  provido. 
Acórdão 
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são  partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior  Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos  termos do voto do Sr. Ministro Relator, que ressalvou o seu ponto de vista. Os  Srs. Ministros Luiz Fux e Teori Albino Zavascki votaram com o Sr. Ministro  Relator. Ausentes o Sr. Ministro Francisco Falcão e, justificadamente, a Sra.  Ministra Denise Arruda.
    
                                            
                                            
                                            
                                            
Precisa estar logado para fazer comentários.